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Pede o desejo, dama, que vos veja,
Não entende o que pede, está enganado.
É este amor tão fino e tão delgado¹,
Que quem o tem não sabe o que deseja.
Não há cousa a qual natural² seja
Que não queira perpétuo o seu estado,
Não quer logo³ o desejo o desejado,
Por que não falte nunca onde sobeja⁴.
Mas este puro afeito⁵ em mim se dana,
Que como⁶ a grave⁷ pedra tem por arte
O centro desejar da natureza⁸.
Assim o pensamento (pela parte
Que vai tomar de mim, terrestre, humana)
Foi, senhora, pedir esta baixeza.
(Camões. 20 sonetos, 2018.)
¹ fino, delgado: refinado, espiritual.
² natural: pertencente à natureza, da natureza.
³ logo: dessa forma.
⁴ sobeja: sobra.
⁵ afeito: afeto, sentimento.
⁶ que como: da mesma forma que.
⁷ grave: pesada.
⁸ centro da natureza: chão.
Depreende-se da segunda estrofe que
o amor, ainda que se acabe, pode renascer.
o amor satisfeito converte-se em mais amor.
o amor verdadeiro é uma ilusão.
o amor satisfeito é um amor extinto.
o amor verdadeiro modifica-se com o tempo.
Sonetos camonianos costumam apresentar um desenvolvimento em que as estrofes criam um contraste entre si. No poema analisado, esse contraste é estruturado entre a pureza do amor, idealizado pelo eu lírico, e o desejo carnal de vivê-lo. Além disso, o texto explora outra dicotomia: o sonho de tomar a amada para si é, ao mesmo tempo, uma forma de negá-lo, visto que a realização do desejo colocaria um fim à vontade de idealizá-lo.
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