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REDAÇÃO
Texto 1
Com o avanço das tecnologias digitais de informação e comunicação e o crescente uso das redes sociais, foram extintas, para muitos, as divisas entre o espaço real e o virtual. A sociedade de hoje experimenta o resultado do surgimento de diversos fenômenos que transformaram a forma como interagimos com o mundo, através do uso dessas plataformas, que ressignificam diariamente os processos sociais e comunicacionais. Nesse cenário, a morte e o luto receberam um novo sentido para o ambiente online.
O professor do Centro de Pesquisa em Mídia, Comunicação e Informação da Universidade de Bremen, na Alemanha, Andreas Hepp, considera que a midiatização cotidiana confere às redes sociais uma intersecção da vida pública com a privada, na qual as pessoas se envolvem e interagem umas com as outras, mesmo sem ter vínculos fora das telas.
A velocidade de transmissão de informações por meio das redes sociais, não só fornecidas em tempo real, mas também reemitidas por meio do compartilhamento, tem o poder de alcançar, em poucos segundos, inúmeras pessoas, tornando a propagação da notícia ainda mais rápida entre os usuários. Com isso, entre tantos usos e sentidos que as redes sociais atribuíram para o luto e a morte, tornar público esse momento pode assegurar manter viva a memória de uma pessoa que morreu por meio da lembrança coletiva, já que a morte representa algo como o fim ou o esquecimento de tudo.
Por outro lado, para além do desejo de dar voz à dor da perda, a atitude de tornar público também pode ser associada ao fato de que a morte é uma questão que naturalmente desperta curiosidade e, quando partilhada no ambiente virtual, tem o poder de transformar-se em espetáculo, através de likes, comentários e compartilhamento, chamando ainda mais a atenção das pessoas para o acontecimento.
(Patrícia Patrocínio. “Você já se perguntou sobre o ato de compartilhar o luto nas redes sociais?”. https://mercadizar.com, 16.12.2020. Adaptado.)
Texto 2
A morte, parece, já foi mais simples. Antes das vacinas, dos antibióticos e de outras intervenções da medicina, morria-se com tanta facilidade que chegar à idade adulta era quase um jogo de cara e coroa. Um estudo publicado em 2013 na revista Evolution and Human Behavior analisou 17 sociedades — de comunidades paleolíticas a modernos caçadores-coletores — e concluiu que, em média, 49% da população morria na infância.
Não que se banalizasse a morte. Desde a chamada pré-história, há registro de rituais fúnebres, inclusive entre os extintos neandertais. Os textos deixados pelos gregos enfatizavam o quão trágico era perder um familiar ou amigo; no Antigo Egito, as preparações para esse importante momento começavam ainda em vida.
Morrer, porém, era esperado como parte do ciclo da vida. Talvez, os avanços da medicina tenham nos deixado mal-acostumados: não importa a doença nem a idade do falecido, sempre nos assustamos com um anúncio fúnebre.
Contribui para isso a midiatização da morte, exacerbada pela internet. Morrer tornou-se um espetáculo. Explora-se cada aspecto da vida do falecido: as últimas palavras, o derradeiro jogo de futebol assistido, a lista de maridos/namorados/ficantes, frases célebres, festas a que foi ou deixou de ir. Parece que não basta homenageá-lo, ressaltando seu legado. Alguns sites, contas de redes sociais e programas de TV exploram cada aspecto de sua existência exaustivamente, com o estardalhaço midiático.
(Paloma Oliveto. “A espetacularização da morte”. www.correiobraziliense.com.br, 24.07.2025. Adaptado.)
Texto 3
Quando abro o jornal ou assisto a televisão, encontro a morte em abundância: ela está presente desde as matérias de violência até os obituários de personalidades. Os meios de comunicação, enquanto moldura social, tornaram-se locais de focalização das práticas simbólicas ligadas à morte. Hoje, esse simbolismo adentra as telas.
A transformação das tecnologias de informação doou à morte um significado ampliado, mas, ainda contraditório, oscilando entre a proximidade e o afastamento, como observamos ter acontecido, em geral, nas sociedades ocidentais, em diferentes tempos. À medida que os homens constroem diversas tecnologias a fim de repensar a questão de sua finitude (a partir de técnicas de reprodução, aumento da expectativa de vida etc.), no desejo de afastar a morte de si, erguem monumentos e obras com o objetivo de eternizar a passagem pela Terra. Instauram, nesse sentido, práticas comunicativas que comportam além da informação do enunciado, relações subjetivas que atuam como jogos de veiculação de afetos, e a afetividade está diretamente relacionada à comunhão (à comunidade). A relação da morte com a vida, nesse sentido, é tecida dentro da ordem simbólica, fazendo com que a morte pertença tanto ao universo do indivíduo quanto ao universo social, porque travamos lutas cotidianas a fim de participar da sociedade, pertencer ao nosso tempo, para que, depois de mortos, sejamos lembrados.
(Renata Rezende Ribeiro. A morte midiatizada, 2015. Adaptado.)
Com base nos textos apresentados e em seus próprios conhecimentos, escreva um texto dissertativo-argumentativo, empregando a norma-padrão da língua portuguesa, sobre o tema:
Luto contemporâneo:
entre a espetacularização da morte e a manutenção da lembrança coletiva
A prova de redação da Unifesp surpreendeu os candidatos ao propor como tema a discussão sobre o luto na contemporaneidade. O recorte levou os estudantes a refletirem sobre dois caminhos possíveis na forma como a sociedade lida com a morte hoje: a espetacularização do luto e a manutenção da lembrança coletiva.
Diante de um tema com esse enfoque, foi praticamente inevitável que muitos candidatos recorressem à recente morte da cantora e empresária Preta Gil como repertório sociocultural. Trata-se de um acontecimento amplamente midiatizado, que ocupou espaço significativo nos meios de comunicação e nas redes sociais, configurando um exemplo emblemático da maneira como o luto tem sido vivenciado e exposto na sociedade contemporânea. Esse episódio dialoga diretamente com a proposta da prova e poderia ser mobilizado de forma pertinente para contextualizar e problematizar a temática.
Embora o tema tenha causado impacto por abordar diretamente a morte e o luto - assuntos que nem sempre aparecem de forma tão explícita nas propostas de redação -, a organização da frase temática seguiu um padrão já conhecido dos candidatos: a apresentação de um tema a ser pensado a partir de dois lados em debate. Esse formato de frase temática é clássico nas provas da banca da Vunesp.
Para a elaboração do texto dissertativo-argumentativo, os candidatos contaram com uma coletânea composta por três textos. Embora um pouco mais exigente em termos interpretativos do que o habitual para a banca, a coletânea oferecia elementos suficientes para a construção de uma argumentação consistente.
O primeiro texto, de Patrícia Patrocínio, abordava diretamente o luto contemporâneo, destacando como as redes sociais ressignificaram a experiência da morte. Nesse contexto, o luto passa a ser também uma forma de gerar audiência e até monetização, já que a morte, enquanto tema, desperta curiosidade e atenção. A partir dessa perspectiva, o candidato poderia compreender por que há tantas matérias jornalísticas, páginas de redes sociais e conteúdos midiáticos que exploram acidentes, assassinatos e falecimentos de pessoas famosas, transformando esses acontecimentos em produtos amplamente consumidos.
O segundo texto da coletânea, de Paloma Oliveto, publicado no Correio Braziliense, aprofundava a discussão sobre a espetacularização da morte. O texto apontava para uma mudança no significado social do morrer, que deixa de ser percebido como um processo natural e passa a provocar espanto, choque e comoção pública. Esse estranhamento contribui para a midiatização do luto, uma vez que a mídia passa a explorar detalhes da vida do falecido, curiosidades, hábitos, trajetórias e até os últimos momentos de vida. Novamente, o caso de Preta Gil se apresenta como um exemplo possível, dada a ampla cobertura sobre sua carreira, sua doença, seus últimos dias e as pessoas que estiveram ao seu lado.
Já o terceiro texto dialogava com o outro polo da proposta temática: a manutenção da lembrança coletiva. A partir do simbolismo da morte, o texto discutia a tentativa humana de eternização, seja por meio de monumentos, homenagens póstumas ou rituais que buscam preservar a memória dos que se foram. Também nesse ponto era possível articular o debate ao caso de Preta Gil, especialmente diante das notícias sobre homenagens realizadas após sua morte, como a transformação de suas cinzas em diamantes distribuídos entre familiares e amigos, gesto simbólico que remete à ideia de permanência e memória.
Diante desse conjunto de textos e da proposta apresentada, os candidatos dispunham de diversas possibilidades argumentativas. Poderiam tratar a questão como uma dicotomia, discutindo qual dos dois aspectos - a espetacularização da morte ou a manutenção da lembrança coletiva - prevalece ao analisar criticamente o luto contemporâneo; ou ainda desenvolver uma argumentação que contemplasse ambos os lados, estabelecendo uma hierarquia entre eles e indicando, na conclusão, qual se mostra mais dominante na sociedade atual.
Por fim, considerando o contexto de uma sociedade marcada pela lógica capitalista e pela centralidade da mídia e das redes sociais, é compreensível que muitos estudantes tenham defendido a ideia de que a espetacularização da morte tende a se sobrepor à manutenção da lembrança coletiva, ainda que esta última continue existindo como valor simbólico e cultural importante.
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