Redação - 2ª Fase Dia 4 - IME 2025

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Texto I

Bem-estar digital: aprenda a equilibrar o uso da tecnologia na sua rotina

          A tecnologia tornou-se crucial em nossas vidas. Com ela, nos mantemos informados, conhecemos novos lugares e produtos, mantemos contato com pessoas queridas, nos inspiramos e nos entretemos.

          O uso de novas tecnologias também nos permite aprender, trabalhar, fazer compras, pagar contas, realizar consultas médicas, ajudar e conhecer outras pessoas, entre milhares de outras atividades cotidianas. A grande questão, entretanto, é: qual o nível de controle que temos sobre a tecnologia e tudo que ela alcança?

          Com raras exceções, a maioria de nós está gastando cada vez mais tempo online. Um estudo da empresa Zenith mostrou que, em 2019, um adulto passava cerca de 3 horas e meia por dia usando a internet em seu telefone. Já uma pesquisa recente realizada pela DoubleVerify em 5 países indica que, a partir da quarentena de 2020, as pessoas passam, em média, 7 horas consumindo conteúdo todos os dias. Esse tempo de tela inclui telefone, TV e outras formas de mídia digital.

          Muitos de nós estamos mais ou menos conscientes dos limites e do quanto as tecnologias têm um impacto insalubre sobre nossa saúde física e mental, e também sobre nossas relações sociais. Mas também sabemos que nem sempre é fácil se desconectar.

https://www.thinkwithgoogle.com/intl/pt-br/futuro-do-marketing/transformacao-digital/bem-estar-digital-uso-tecnologia/

Texto II

https://blogdoaftm.com.br/charge-threads-novas-redes-sociais/

A partir das ideias abordadas a respeito do tempo na prova de português e nos textos motivadores, produza um texto dissertativo-argumentativo que discorra sobre os impactos do uso da tecnologia na gestão do tempo.

Em sua escrita, atente para as seguintes observações:

1. Considere a norma culta da língua portuguesa. Eventuais equívocos morfossintáticos, erros de regência, concordância, coesão e coerência, bem como desvios da grafia vigente e a não observância das regras de acentuação serão penalizados;

2. O texto deverá ter entre 25 (vinte e cinco) a 30 (trinta) linhas escritas com caneta de tinta azul. A produção de texto DEVERÁ ser realizada no CADERNO DE SOLUÇÕES; e

3. Não copie nem faça paráfrases de nenhuma parte dos textos apresentados neste exame, seja da prova de português ou seja da prova de inglês.

Comentário:

A prova de redação do IME 2025 demonstrou-se coerente e atual ao se debruçar sobre um dos grandes questionamentos dos últimos anos: “Os impactos do uso da tecnologia na gestão do tempo”. Conforme a própria coletânea expôs, o tema vem ganhando destaque justamente por conta da dificuldade de se viver off-line, ou seja, de se desconectar de ferramentas tecnológicas durante as horas de cada dia. De forma similar à discussão atual, o debate envolve desde suas implicações mais práticas e concretas até as mais filosóficas e existenciais.  

Para escrever a redação, era preciso considerar dois textos prévios da prova de Português e dois textos que compunham a proposta junto de seu enunciado. Assim, trata-se de uma prova que sugere uma interpretação interseccionada entre o conjunto da redação e o conjunto de Português.  

Antes disso, o próprio candidato poderia buscar questionamentos mais aprofundados que o guiassem em seu projeto de texto e leitura interpretativa ao analisar a pergunta-tema:  

1. Há impactos em que áreas da vida (dos afetos, do trabalho, dos estudos, do cotidiano, etc.)?  

2. Esses impactos são positivos ou negativos do ponto de vista de certos grupos sociais?  

3. Sobre quais vieses abordar a dimensão do tempo? Da Física, da Filosofia, da experiência subjetiva?  

Os textos prévios e a coletânea da proposta caminhavam no sentido dessas subquestões de análise. O conto “O Imortal”, de Machado de Assis, traz uma narrativa subjetiva e possivelmente duvidosa de um médico homeopata que alega ter tido um pai “imortal” — apesar deste ter morrido. Sem evidência além de seu próprio testemunho, a história do Dr. Leão, aos moldes das postagens de influencers atuais, termina com uma lição curta e clichê de que a vida só tem valor justamente por ser finita. Embora clichê, não deixa de colocar em questão qual o valor das experiências vividas frente à espetacularização eternizada on-line, visto que vivemos tempos em que a tecnologia se torna quase que uma extensão do humano, impedindo-nos de considerar viver hoje sem um celular com internet para postar ou consumir fotos de cada experiência, registrada eternamente em redes sociais e em nuvens de armazenamento.  

Por outro lado, poderia-se pensar de forma objetiva e materialista. Em cada época — tempo, momento — da civilização, a classe hegemônica definiu não só qual era o jeito ideal de se viver — ditando costumes, prazeres, normas afetivas, etc —, como também a importância de aparentar tal vida — algo que Machado de Assis criticou duramente ao associar à burguesia de seu tempo. Assim, alienados como os ouvintes do Dr. Leão, estamos seguindo o costume: deixando nosso tempo de vida preso ao tempo das imagens e vídeos na internet sob a sensação de eternização das nossas memórias — cada vez mais corriqueiras e, então, sem sentido ou valor. Mas para que serve esse “desperdício” do tempo e, portanto, da vida? Nessa lógica, o tempo gasto equivale ao consumo de ideias, produtos e normativas sociais a serem incorporadas. Quanto mais tempo on-line, mais adequado se está ao sistema vigente e seus valores. Afinal, não se pode esquecer que, no capitalismo, tempo é dinheiro — de trabalho e de consumo, não de ócio e reflexão, ou, como a charge do texto II da coletânea expunha, mais tempo fora da realidade. Com isso, mais alienação e padronização dos comportamentos, dos pensamentos e do consumo por consequência. 

A partir dessas ideias, o candidato poderia usar o próprio movimento realista e as tópicas machadianas para construir sua tese e análise argumentativa. Ainda, para trazer ao âmbito mais atual, valeria citar Guy Debord (conceito de Sociedade do Espetáculo), a Escola de Frankfurt (conceito de indústria cultural), Byung Chun Han (lógica da positividade tóxica nas redes que nos impõe a máxima produtividade e conduz à Sociedade do Cansaço). Séries como Black Mirror também valeriam de motivação para a construção desse admirável mundo novo em que o on-line é quase uma ditadura aprisionante do nosso tempo e de como nossas relações se consolidaram superficiais e dinâmicas (seguindo a ideia de pós-modernidade líquida de Zygmunt Bauman). 

Ainda, apesar da tecnologia ser o determinante da questão da proposta do IME, não se deve esquecer que o próprio entendimento de tempo estava em foco, conforme expunha o texto II da prova de Português, da revista Superinteressante. Talvez o tempo torne-se um mecanismo mais maleável pelos grupos dominantes justamente pela sua pouca palpabilidade e relatividade, inclusive conceitual. Não era preciso, nem esperado, que o candidato desse uma definição de tempo — justamente porque, como o artigo demonstrava, esta questão é secular e interdisciplinar. O que era preciso, no entanto, era entender que o tempo é um mecanismo ou objeto de disputa — não apenas científico — por ser determinante para a própria ideia de vida, de propósito humano e de relações. O que acontece com a vida e com as relações quando, de acordo com o texto I da proposta de redação, desde a pandemia vivemos uma média de 7 horas on-line? Quando “escolhemos” a tela — a mimetização das experiências — em vez da própria experiência? Mas, e esta talvez seja a maior questão por trás do tema da prova, quem pode escolher fazer diferente? Quem pode viver mais de 7 horas fora do on-line depois da interligação, do enredamento entre tecnologia e vida, cada vez mais promovidos nos últimos anos, em especial pós-isolamento social?  

Por fim, ainda que idealista, propor uma vida mais fora da telas, fora do on-line, seria quase que incoerente, tendo em vista a coerção das estruturas sociais atuais. Já se pode dizer, inclusive, que a separação entre virtual e real é quase que ultrapassada, afinal a internet, as redes sociais e os aplicativos não são frutos da imaginação, mas usados e construídos por pessoas reais a todo momento. O sistema e os grupos dominantes, como a história demonstra, são os determinantes do tempo das massas há séculos, não seria diferente agora. Dialética e contraditoriamente, a vida fora das telas torna-se um privilégio e, ainda assim, dificilmente deixará, nem nas classes mais altas, de ser espetacularizada nas redes.  

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