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Recentemente, pesquisadores identificaram a presença de Machado de Assis entre os convidados da família imperial brasileira para a missa campal realizada em comemoração à abolição da escravatura. A fotografia mostra participantes da missa ocorrida no dia 17 de maio de 1888 no Campo de São Cristóvão, Rio de Janeiro, com a presença da princesa Isabel, do Conde D’Eu e de outras celebridades do Império, além do escritor (no destaque, circulado). Observe a fotografia e leia o trecho de Quincas Borba:
Antonio Luiz Ferreira. Missa campal celebrada em ação de graças pela Abolição da Escravatura no Brasil, 1888. São Cristóvão, Rio de Janeiro. Fonte: Acervo Instituto Moreira Salles.
“Na esquina da Rua dos Ourives deteve-o um ajuntamento de pessoas, e um préstito singular. Um homem, judicialmente trajado, lia em voz alta um papel, a sentença. Havia mais o juiz, um padre, soldados, curiosos. Mas, as principais figuras eram dois pretos. Um deles, mediano, magro, tinha as mãos atadas, os olhos baixos, a cor fula, e levava uma corda enlaçada no pescoço; as pontas do baraço iam nas mãos de outro preto. Este outro olhava para frente e tinha a cor fixa e retinta. Sustentava com galhardia a curiosidade pública. Lido o papel, o préstito seguiu pela Rua dos Ourives adiante; vinha do Aljube e ia para o Largo do Moura.
Rubião naturalmente ficou impressionado. Durante alguns segundos esteve como agora à escolha de um tílburi. Forças íntimas ofereciam-lhe o seu cavalo, umas que voltasse para trás ou descesse para ir aos seus negócios – outras que fosse ver enforcar o preto. Era tão raro ver um enforcado! Senhor, em 20 minutos está tudo findo! – Senhor, vamos tratar de outros negócios! E o nosso homem fechou os olhos, e deixou-se ir ao acaso.”
Machado de Assis. Quincas Borba.
A relação entre a obra de Machado de Assis e a questão afrobrasileira é complexa. Ao longo do século XX, houve o que a crítica chamou de um “branqueamento” da figura desse que é considerado nosso maior escritor.
a) A partir do trecho citado do romance Quincas Borba, é possível caracterizar o personagem Rubião como um apoiador do abolicionismo? Justifique sua resposta.
b) Explique a tensão entre a fotografia e o excerto, considerando a caracterização da sociedade brasileira do fim do século XIX, tal como representada no romance.
a. O trecho de Quincas Borba apresenta uma cena em que uma multidão assiste à leitura da sentença de um criminoso negro condenado à forca. O foco do narrador não está na violência da cena em si, mas na indiferença e no espetáculo que a execução representa para os presentes, que observam o evento como se fosse um mero entretenimento. Rubião, ao expressar surpresa pelo enforcamento, demonstra que sua reação é de curiosidade, e não de empatia, evidenciando seu distanciamento das questões sociais e seu alheamento ao abolicionismo. Seu comportamento revela, ainda, descompromisso com a causa da libertação dos escravizados, reforçando seu perfil como alguém que meramente acompanha os acontecimentos sem se engajar em mudanças estruturais.
b. A fotografia retrata Machado de Assis, um escritor afrodescendente, quase oculto em meio a uma multidão predominantemente branca, em um evento que celebra a abolição da escravidão. Essa cena contrasta com o trecho do romance, em que a multidão se reúne para assistir ao enforcamento de um homem negro, um evento que, ao contrário da missa campal, não é uma comemoração, mas um espetáculo grotesco de violência legitimada. A sociedade brasileira do fim do século XIX, como representada na cena de Quincas Borba, refletia, ainda, as marcas profundas do racismo estrutural, que manteve a condição de exclusão da população negra mesmo após a abolição. A comparação entre o apagamento da figura de Machado na fotografia e a brutalidade da cena retratada no romance sugere que a abolição, embora celebrada, não significou, na prática, a inclusão dos negros na sociedade, mas a manutenção de estruturas de poder que favoreciam a elite branca.
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