Questão 36 - Dia 1 - Amarelo - Enem 2024

Gabarito

Questão 36

Objetiva
36

Data venia

     Conheci Bentinho e Capitu nos meus curiosos e antigos quinze anos. E os olhos de água da jovem de Matacavalos atraíram-me, seduziram-me ao primeiro contato. Aliados ao seu jeito de ser, flor e mistério. Mas tornou-me também a indignação diante do narrador e seu texto, feito de acusações e vilipêndio. Sem qualquer direito de defesa. Sem acesso ao discurso, usurpado, sutilmente, pela palavra autoritária do marido, algoz, em pele de cordeiro vitimado. Crudelíssimo e desumano: não bastasse o que faz com a mulher, chega a desejar a morte do próprio filho e a festejá-la com um jantar, sem qualquer remorso. No fundo, uma pobre consciência dilacerada, um homem dividido, que busca encontrar-se na memória, e acaba faltando-se a si mesmo. Retomei inúmeras vezes a triste história daquele amor em desencanto. Familiarizei-me, ao longo do tempo, com a crítica do texto; poucos, muitos poucos, escapam das bem traçadas linhas do libelo condenatório; no mínimo concedem à ré o beneplácito da dúvida: convertem-na num enigma indecifrável, seu atributo consagrador.

     Eis que, diante de mais um retorno ao romance, veio a iluminação: por que não dar a voz plena àquela mulher, brasileira do século XIX, que, apesar de todas as artimanhas e do maquiavelismo do companheiro, se converte numa das mais fascinantes criaturas do gênio que foi Machado de Assis?

     A empresa era temerária, mas escrever é sempre um risco. Apoiado no espaço de liberdade em que habita a Literatura, arrisquei-me.

     O resultado: este livro em que, além-túmulo, como Brás Cubas, a dona dos olhos de ressaca assume, à luz do mistério da arte literária e do próprio texto do Dr. Bento Santiago, seu discurso e sua verdade.

PROENÇA FILHO, D. Capitu: memórias póstumas.
Rio de Janeiro: Atrium, 1998.

Para apresentar a apropriação literária que faz a obra de Machado de Assis, o autor desse texto

Alternativas

  1. A

    relaciona aspectos centrais da obra original e, então, reafirma o ponto de vista adotado.

  2. B

    explica os pontos de vista de críticos da literatura e, por fim, os redimensiona na discussão.

  3. C

    introduz elementos relevantes da história e, na sequência, apresenta motivos para refutá-los.

  4. D

    justifica as razões pelas quais adotou certa abordagem e, em seguida, reconsidera tal escolha.

  5. E

    contextualiza o enredo de forma subjetiva e, na conclusão, explicita o foco narrativo a ser assumido.

Gabarito:
    E

Para apresentar o enredo da obra de Machado de Assis, o autor do texto decide apresentar sua experiência pessoal de leitura, associando a obra à sua subjetividade. Em seguida, a partir do segundo parágrafo do texto, passa a indicar um viés de leitura para sua própria obra, o livro que busca abordar a perspectiva de Capitu, explicitando, assim, o foco narrativo a ser assumido.

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